Como foi o seu primeiro dia?
Como
foi seu primeiro dia de escola? Fez muitas amizades imediatamente ou demorou um
certo tempo até estar familiarizado com o ambiente? Como era sua relação com os
professores: saudável ou conflituosa? Você tem saudades dessa época de infância
e juventude? Agora, pensando por outro lado: era um daqueles que ficavam
quieto, reservado e quase passou todo esse período do ensino fundamental e
médio sem amizades? Se se identificou, talvez sua jornada escolar fora muito
parecida com a minha. Claro que me relacionava com algumas pessoas, não ficava
de todo isolado, porém, construir laços profundos de amizade e companheirismo
quase inexistia. É engraçado, ao mesmo tempo, fazer uma retrospectiva, já que
terminei minha graduação recentemente e estou planejando os próximos passos. O
tempo passa rapidamente, muito mais do que imaginamos. A fase escolar se
configura com uma das mais determinantes e impactantes na formação do nosso campo
emocional, social e psíquico. Ninguém
deixa aquele espaço sem estar marcado pelas vivências e experiências absorvidas
ali.
O
instante em que entra na sala de aula, fora do ambiente seguro como é a casa e
o quarto, ocorre múltiplas sensações no corpo: irritações, inseguranças e
calafrios. Como já disse anteriormente, o novo é nada atrativo, gostamos tudo
do mesmo jeito, sempre assim. Para o espectro autista a escola é um ambiente
desorganizado e agitado. Enfrentar a sala de aula, os desafios da socialização,
o momento de introduzir-se para os colegas, falando sobre si mesmo, é
extremamente complexo. As atividades em grupo também acabam sendo desgastantes.
Para os neurotípicos pode parecer natural estabelecer relacionamentos, alguns
até constroem amizades logo no primeiro dia. O que de certa forma acabava
invejando: “o que eles têm que eu não tenho?”. A escola e os professores acabam
exigindo muito de nós, não compreendendo nossas limitações. É muito comum, para
autistas em situação mais crítica e vulnerável, evadir a escola. Precisamos
pensar muito e urgentemente, como incluir e tornar acessível à pessoas do
espectro autista o ensino básico no Brasil, de forma total e real,
ultrapassando a formalidade da lei. Há tentativas, mas falta uma inclusão
funcional, em que diretores, professores e profissionais terapêuticos trabalhem
em conjunto, com materiais adequados de apoio.
Provavelmente quem está lendo possui algum filho, irmão ou parente que lida com essas mesmas dificuldades. Pois bem, há bastante coisa ainda por ser feita para que crianças e jovens parte do espectro autista permaneçam na escola e tenham direito à educação. A escola todavia é um ambiente demasiadamente excludente, baseada num sistema educacional arcaico que não valoriza a neurodiversidade e as diferenças. Reproduz padrões e regras que para alguns pode parecer doloroso e incômodo. Para quem faz parte do espectro autista, afasta e desanima. Gostamos muitas vezes de estudar e aprender, mas a maneira como os professores ensinam é inadequada ou não atende as nossas necessidades de conhecimento. Acredito que estamos muito longe de alcançar uma sala de aula que seja acolhedora e saiba conviver com a alteridade. Espero que futuramente as portas estejam abertas para que não haja mais exclusão e que o espectro autista também alcance degraus maiores, inclusive o âmbito universitário, onde muito poucos conseguem adentrar.
Vitor Lucas
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